Adelino Cunha

Historiador, investigador e professor de História Contemporânea, Adelino Cunha é autor dos livros A Ascensão ao Poder de Cavaco Silva (2005); António Guterres – Os Segredos do Poder (2013); Os Filhos da Clandestinidade – História da Desagregação das Famílias Comunistas no Exílio (2016); Júlio de Melo Fogaça – Biografia (2018); Álvaro Cunhal – Retrato Pessoal e Íntimo (2019).

Em, Júlio de Melo Fogaça – Biografia, Adelino Cunha resgata das brumas da memória o ex-líder do PCP cuja homossexualidade levaria a que sucumbisse num limbo de ostracismo político-partidário em 28 de Janeiro de 1980 e que o seu nome se tornasse quase desconhecido em Portugal. Recorrendo a um conjunto diverso de fontes que vão desde o arquivo pessoal de Fogaça, depositado na Academia das Ciências, aos arquivos de tribunais e da PIDE, passando por jornais e livros de história e de memórias e ainda relevantes depoimentos exclusivos de Edmundo Pedro, Carlos Brito e Domingos Abrantes, Adelino Cunha mostra-nos o que é possível recuperar da vida e do papel político de Fogaça.

Filho de José Maria das Neves Fogaça e de Maria José de Melo, nascido na Quinta do Porto Nogueira, Cadaval, a 10 de Agosto de 1907, no seio de uma família fidalga, adere ao PCP por volta de 1932-1933 tornando-se um dos principais intelectuais e ideólogos deste partido nos anos quarenta e cinquenta do século XX.


Tendo sofrido um total de 19 anos de passagem pelas prisões políticas do Estado Novo, Fogaça é preso a primeira vez em 1935, no forte-prisão de São João Baptista, em Angra do Heroísmo e, em 1936, é um dos presos políticos que estreiam o Campo Prisional do Tarrafal. Libertado em 1940, devido à Amnistia dos Centenários (1140 e 1640), é de novo preso em 1942 e enviado mais uma vez para o Tarrafal, sendo libertado em 1945. A sua terceira prisão ocorre em 28 de Agosto 1960, ficando preso em Caxias e Peniche até 1970.

É a sua terceira pena de prisão que mostra maior controvérsia tendo sido detido pela PIDE, nas ruas da Nazaré, acompanhado pelo seu companheiro Américo Joaquim Gonçalves, com quem mantinha, há três anos, uma relação amorosa, também detido “por ser seu companheiro”. Na sequência desta prisão, Fogaça é suspenso do PCP e posteriormente expulso em 1961, sob acusação de pôr em risco a organização clandestina do partido.

Ficou apagado da história do partido, desconhecendo-se as verdadeiras circunstâncias da expulsão de Júlio Fogaça, mas adivinham-se razões políticas, questões relacionadas com grave negligência nos cuidados conspirativos da clandestinidade da sua relação e do conservadorismo moral que o PCP não era imune. Reduzindo a homossexualidade a doença e perversão, o partido não lhe reconhece dignidade para estar ao seu lado numa acusação política.

A sentença desse processo foi lavrada e copiada para a ficha da PIDE de Fogaça:

«Julgado em 6-4-962 pelo Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, tendo sido classificado de pederasta passivo e habitual na prática de vícios contra a natureza, mas para ficar sujeito, durante cinco anos à regeneradora medida de segurança de liberdade vigiada, com início na data da sua soltura e cujo exercício se lhe limita através do íntegro cumprimento das seguintes obrigações específicas: 1) fixar residência nesta cidade, de que dará verdadeiro conhecimento à PJ, mas de onde não se pode ausentar sem prévia autorização deste tribunal; 2) dedicar-se ao trabalho honesto, com permanência, mas não mais à prática de qualquer vício contra a natureza; 3) não acompanhar cadastrados, antigos companheiros de prisão, pederastas ou quaisquer pessoas de conduta duvidosa; 4) aceitar a fiscalização da sua conduta pela P. J. onde tem de se apresentar todos os meses e em dias e horas que lhe forem determinados».

Após a revolução do 25 de Abril de 1974, Júlio Fogaça presidiu à Comissão Administrativa da Câmara do Cadaval e sabe-se que participou em actividades do MDP. 

Faleceu em 1989 e todo o seu espólio foi doado à Academia das Ciências mas na condição de o tratarem e colocarem à disposição dos investigadores e de instituírem um prémio anual de História com o seu nome.


O espólio legado à Academia das Ciências de Lisboa (ACL) – entre outros bens – contém um fundo bibliográfico composto por 1734 monografias, diversas publicações periódicas, numerosas obras literárias, mas sobretudo das áreas da História e da Política; e ainda várias caixas de documentação do seu arquivo pessoal. Este fundo documental, que actualmente está integrado no acervo geral da biblioteca da ACL, foi objecto de tratamento documental entre 1998-2003, tendo sido concluído em 2006.

Saída de Emergência, 2018.

ISBN:  9789898892218 Editor: Desassossego Páginas: 320


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